Texto publicado originalmente na revista digital Latitude 21, edição de agosto de 2024.
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Por Prof. Dr. Fernando S. Okimoto
Não há uma definição sedimentada de bioconstrução na literatura, pelo menos na atual. Fala-se de construções sustentáveis, materiais ecofriendly, técnicas apropriadas e outras, mas sem uma visão mais abrangente e sistêmica da construção civil.
A bioconstrução sempre foi mais alinhada com construções em terra crua ou bambu, sem tecnologias e equipamentos envolvidos, quase um sinônimo de construções rudimentares. Entretanto, a busca por um novo paradigma para a construção civil contemporânea, fundamentada na sustentabilidade ambiental, econômica e social, com tecnologia, tem ampliado o conceito de bioconstrução para algo como:
Sendo assim, não é possível negar a tecnologia, é incoerente não reconhecer o papel transformador que ela pode desempenhar ao viabilizar e humanizar as necessidades construtivas de espaços e ambientes. Alinhado a esta inversão de paradigma, o uso de madeiras de florestas plantadas, manejadas em detrimento dos tradicionais concretos, dos aços e de madeiras de florestas nativas é uma excelente alternativa.
As florestas manejadas produzem madeiras mais apropriadas à construção civil, produzem trabalhos mais formais e seguros, sequestram CO2, são renováveis, têm menos defeitos físicos como nós, consomem pouca energia elétrica e água no seu ciclo de vida e, após o fim da vida útil do material, seu descarte será absorvido pelo meio ambiente rapidamente.
Normalmente, se plantam áreas de espécies do gênero pinus e eucaliptos por sua rapidez de crescimento, facilidade de tratamentos preventivo químicos (para o pinus!) e porque o mercado externo acaba por comprar tudo o que for colocado à venda.
As durabilidades naturais dessas espécies não são grandes e para aumentar a durabilidade e diminuir a manutenção, são tratados dessa forma. Assim, pode-se perceber o paralelismo com a grandeza e diversidade da cadeia de valor do Jatobá (hymenaea sp), aqui descritas.
O viés não contaminante das escolhas bioconstruídas toca os conceitos de segurança alimentar dentro da cadeira de valor do Jatobá. As escolhas materiais também, mas ficam mais evidentes as bioconstruções das infraestruturas de saneamento (abastecimento, esgotamento, drenagem e resíduos sólidos que a bioconstrução se preocupa. Exemplifica-se com utilização de materiais residuais de outros setores industriais e até mesmo da própria indústria da construção civil como materiais de construção. Utilização de materiais de demolição, entulhos da construção civil tradicional e outros resíduos incorporados na produção de materiais para novas construções. O alto aproveitamento material em todas as etapas da cadeira do Jatobá tangencia esses conceitos supracitados.
Por fim, dentro da cadeia do Jatobá, no final da produtividade da árvore, a madeira de jatobá pode ser aproveitada para a construção civil. A situação de redução de espécimes existentes foi construída sobre o entendimento que a madeira de jatobá é resistente e durável, dentre outras características físicas que levaram a seu extermínio em massa no passado recente. Sabe-se do uso intenso da madeira de jatobá em estrutura expostas por causa da sua alta durabilidade natural. Segundo Lahr et al (2016), o Instituto de Pesquisas Tecnológicas avaliou o jatobá genérico (IPT, 1989 apud Lahr et al, 2016) e afirma que as propriedades mecânicas da madeira são elevadas, sendo o valor médio de resistência na compressão paralela às fibras são de 82,2 MPa (a 15% de teor de umidade). Também caracterizam a madeira de jatobá como altamente resistente ao ataque de fungos, impermeável a tratamentos preservativos, com densidade aparente de 0,96g/cm3 (a 15% de teor de umidade). Assim, fica claro que a madeira de jatobá manejado deve ser indicada para estruturas eficientes, resistentes e duráveis cruzando com a cadeia de valor do jatobá.
Portanto, estamos trabalhando na proposição de um espaço físico em um terreno de 13m por 33m, que agregaria o recebimento, o processamento do fruto e a triagem da casca, da semente e do fruto, caracterizando o processamento do fruto para a produção de farinha. A proposta é bioconstruída com estrutura das paredes e os pisos em blocos de solo-cimento com resíduos da construção civil e coberturas em geodésicas de madeira de reflorestamento em um primeiro momento e madeira de jatobá, na primeira oportunidade de manutenção material da geodésica. Outras tecnologias são previstas para outros subsistemas do espaço. Revestimentos impermeáveis de Tadelakt para as pias de banheiro e de cozinha. Saneamento mais ecológicos.
Tal proposta se fundamenta no planejamento permacultural que incorpora os conceitos de agroecologia, da bioconstrução e das tecnologias sociais. Aliado a bioconstrução, hortas e espirais de ervas, torres aeropônicas são sugeridas para uma soberania e segurança alimentar na agroecologia, assim como a organização cooperativa e colaborativa dialógicas das tecnologias sociais.
Texto publicado originalmente na revista digital Latitude 21, edição de agosto de 2024.
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